É dos livros que em qualquer Estado desenvolvido a grossa maioria da despesa é no social: Saúde, Educação, Pensões de Reforma, Abonos e Subsídios em todas as situações de carência. Às vezes nem tanto!
Foi exactamente isso que aconteceu. Nos ciclos de não crescimento, ou mesmo de decréscimo, (está-se a falar da zona ocidental do mundo, do mundo designado como desenvolvido) sempre se procedeu a aumentos de salários, sempre houve progressões de carreira, sempre se acrescentou algo aos abonos e subsídios e toda a política, económica e social, foi sempre e só orientada para a melhoria do bem-estar dos actuais trabalhadores, ignorando-se que teria de se garantir futuro para os activos de agora, para os activos de ontem e hoje já inactivos, e para os inactivos por toda uma série de incapacidades, nomeadamente pela incapacidade, cada vez mais notória, de criação de emprego para toda a gente que vai chegando à idade de entrar no mercado de trabalho, idade cada vez mais retardada por virtude do acesso generalizado ao ensino básico prolongado e aos outros níveis de aprendizagem.
Significa que as empresas manufactureiras tiveram que passar a investir permanentemente na investigação de novos produtos, de novos modelos, de novos mercados e de novos equipamentos para produzirem ainda mais e com menos mão-de-obra. E sempre que melhora a técnica produtiva, ou dispensa mão-de-obra ou não contrata mais, mesmo que precisando de aumentar a produção. Donde se infere que, mesmo sem a crise que avassalou agora o mundo, o mundo muito desenvolvido, o mundo desenvolvido, o mundo em vias de desenvolvimento e também o mundo atrasado e muito atrasado, nunca a zona desenvolvida geraria emprego para a toda a sua mão-de-obra disponível.”
Se tivesse havido capacidade de previsão em devido tempo, e capacidade para suster as irrealistas reivindicações dos sindicatos, mesmo em anos de progressão económica, o crescimento de salários e benesses sociais teriam sido bem mais moderado, mais ponderado e as disponibilidades excedentes teriam sido amealhadas para suprir as grandes dificuldades das grandes crises como a que agora atrapalha o mundo. Vemos agora que se despedem pessoas às centenas de milhar, vemos que os Estados, todos, se endividam até ao sem limite para darem algum apoio aos mais empobrecidos e vamos, por certo – e que o diabo seja surdo – ver cair por terra toda a reivindicação exacerbada que ainda se aflora. E muitas coisas vão recomeçar do zero. O tombo virá a ser proporcional à altura atingida.” Os salários começam a baixar generalizadamente em termos absolutos, os subsídios serão, muitos deles, serão reduzidos, ou mesmo extintos. Enfim, as pessoas vão, à força, interiorizar que não é possível continuar a gastar mais do que o que se ganha, que tem que acabar o viver acima da riqueza que se produz. Não causa engulho a qualquer pessoa de bem que um indivíduo (tantos indivíduos!) recorram a instituições de “apoio” porque se endividaram para ir de férias para paraísos exóticos, para trocar de carro e agora não são capazes de satisfazer compromissos. E há quem dê trela a esses safardanas?
E descendo um tanto de escalão, quantas pessoas correm para as assistentes sociais a “pedir socorro” para que lhes paguem a renda, a luz, a água, o gaz, porque o dinheiro não chegou até onde queriam! E o certo é que, no mais das vezes, lá recebem as abébias em dinheiro, esquecendo-se as tais assistentes sociais de averiguarem quanto foi pago em carregamentos de telemóvel, em taxa de TV por cabo, em roupas de marca para os meninos e meninas e em combustível para passeios. Será preciso ir muito longe para topar estes casos?
Quer dizer que se chegou a um ponto em que alguém, se não tirou ainda, vai ganhar coragem para tirar a cavilha de segurança e o sistema vai desabar, a menos que alguém tenha a coragem de, em vez de sacar a cavilha, a desça para uns furos abaixo. Sabe-se que vai doer a muita gente. E não venham com a demagogia de que os ricos não sofrem. Sofrem menos, muito menos, mas a cavilha reguladora é uma só.
Vai crescer o desemprego, vão ser mais condicionados os subsídios de desemprego, vão ser cortados muitos dos subsídios que foram crescendo ao longo do tempo, mas do que carece mesmo o sistema, é de controlo muito apertado sobre os beneficiários. Temos parado para pensar quantas pessoas, da população nacional, vive dependurada nas costas do Estado? Funcionários públicos, subsidiados de desemprego, do RSI,
gente com baixa médica, abonos de família, etc. etc. a que se acrescentam o juros da dívida e lá vão 80% da receita. Fica o quê para investimento, para apoio à dinamização empresarial, etc.?
E afinal, mandar pessoas para o desemprego, não será assim uma medida muito liberal, ou neoliberal, como agora se diz, porque o primeiro, o maior protótipo do esquerdismo, da defesa do povo e do povo trabalhador, da classe proletária, dispensou, ou está em vias de despedir UM MILHÃO E TREZENTOS MIL funcionários públicos. Faz-me pensar na falta de coragem para calcular a produtividade e rentabilidade dos nosso funcionários públicos. Diz-se que pouco mais de metade chegariam. E impor outros sacrifícios também é um gesto claramente de esquerda, pois o mesmo protótipo mantém o regime de racionamento de bens primários desde que tomou o poder. Há 50 anos. E os subsídios de desemprego, se os houver, serão ao nível do salário de um professor ou médico, cerca de 30 dólares por mês, ou seja, 22 ou 23 euros mensais. Isto é em Cuba. Ninguém ousará chamar a Fidel de neoliberal.
Claro que outros há, na casta dos contestatários profissionais, no parlamento, nos sindicatos ou nas manifestações que têm uma saudade terrível dum tal senhor Enver Hoscha, que com mão e bota de ferro manteve o povo da Albânia durante 45 anos a morrer de fome.
José Pinto da Silva
(texto publicado no "Terras da Feira" em 9/08/2010)