Trato-o por
você, porque “senhor” não é e não lhe merece o trato, muito menos o de
excelentíssimo, porque a excelência olhou para si e fugiu e muitíssimo menos o
de meritíssimo, porque de mérito só tem o de não merecer o mínimo de consideração
de quem quer que seja. Perto de si a balança, símbolo da justiça,
encarquilha-se de vergonha.
Uma palavra
que anda semeada por todos os livros que abordem direito e justiça e que você
de certeza olhou, sem dela apreender grande coisa, é a PRESUNÇÃO, no sentido de
que todo o indiciado, todo o acusado é presumido ser INOCENTE enquanto não for
julgado, condenado e com sentença transitada em julgado. Isto é o que diz a lei
e o senso comum, este inspirado naquela.
Mas você –
merecerá o tratamento de você? – no seu concentrado de asco, chafurda no
interior da cloaca e presume tudo ao contrário, presume que quem quis, ou quem
lhe encomendou que fosse detido, interrogado e depois preso, sempre debaixo da
sua presunção de que o supostamente indiciado, é fortemente culpado, ainda que,
forte e insistentemente instado, não seja capaz de apresentar a menor das
evidências.
E, supremo uso
do poder discricionário de quem se sabe impune, invoca o perigo de fuga a um
homem que, estando de costa quente, em país estrangeiro a partir do qual
poderia embarcar para qualquer destino abrigado de toda e qualquer ânsia
revanchista de quem se acha e assume dono do sistema de justiça, suportado este
por um poder corrompido pela sede da subjugação e da humilhação.
No seu próprio
dizer: “ eu fui primeiro-ministro; se não for eu a respeitar as instituições,
quem é que as vai respeitar?” E foi por isso, por aquele sentido de respeito
pelas instituições, que veio entregar-se nas fauces gulosas e salivantes de um
lobo sedento de vingança, mesmo tendo, na véspera da sua auto entrega, expedido
um e-mail para o Ministério Público a manifestar disponibilidade para prestação
das declarações que se impusessem. Esse e-mail terá levado quatro dias a chegar
ao destinatário conveniente. Quando dá jeito, em Portugal, até a electrónica
viaja de camelo. Submeteu-se, pois, à detenção, com câmaras de TV contratadas
para darem dimensão ao destrato, e, sem que lhe mostrassem nada que o
justificasse, prenderam-no, suportando-se na miserável PRESUNÇÃO de riscos
vários, incluindo, olhe-se o critério, no risco de fuga. Prendeu-o, você,
exclusivamente para, no desabafo do preso, “investigar, mas também para o
atemorizar, para o despersonalizar e para o calar”. Para o humilhar e,
entrementes, investigarem ou fazerem que investigam, à revelia das mais aceites
normas que dizem que se investiga para, eventualmente, prender. Prenderam para
investigar e, sobretudo, para humilhando, o tentarem quebrar e obter respostas
que interessassem. Como fazia a pide, de tão má memória. Tem-se visto que
bateram em porta com aldraba rija, que só com luta muito renhida pode quebrar,
porque torcer nunca torcerá. “Só deixa de ser livre quem perde a dignidade.
Sinto-me mais livre do que nunca”. “Estou preso, mas não lhes faço o favor de
ficar calado”. Até os torcionários se admiram…!
A intervenção
recente, em plena campanha eleitoral – chamada de pré-campanha – de figura de
topo do principal partido do actual governo e inserido no meio judicial, porque
pertence a uma sociedade de advogados influente e metediça e ter sido
governante na pasta da justiça, veio mostrar à evidência como a justiça e os
juízes são permeáveis a influências e como, no caso Sócrates, o foram, a troco
saiba-se lá do quê. Que, se os socialistas estivessem no poder, um
primeiro-ministro e um banqueiro não teriam sido investigados. Claro que lhe
fugiu a boca para a razão. Sócrates foi investigado, foi detido e preso, porque
era poder quem era e mandava quem mandava e perante o qual o judicial se verga.
Não terá sido pela mesma influência que Oliveira Costa, Dias Loureiro, Arlindo
Carvalho, (só este terá ensacado 80 milhões – mesmo que os indícios sobre
Sócrates fossem verdade, seriam pinuts ) e outros, têm os processos em banho maria
à espera de possível prescrição?
Há dois meses
ainda havia um pequeno risco de fuga – imagine-se o desplante – e havia risco
de perturbação da investigação. Dois meses depois, acabou de todo o risco de
fuga e não haverá perturbação porque os “indícios estão consolidados”.
Evidências é que ZERO.
Claro que o
espírito torcionário de quem o é vai estender o processo por aí adiante – de
excepcional complexidade – invocarão eles para prolongar a prisão, agora no
domicílio, sem argola electrónica. A prova da dureza da aldraba. Você, enquanto
responsável pela vergonha, acabará humilhado. Ele virá a ser exaltado. Aguarde.
José Pinto da Silva