MUITOS ANOS DEPOIS (8 de Maio de 1970)
Lembrar-se-ão, os que me leram em
Janeiro, que nas linhas debitadas a propósito de minha mãe – tinha passado um
ano sobre o seu passamento – fiz referência, passageira embora, a toda a minha
família directa. Mãe, filhos, netos e mesmo irmãos. Não por esquecimento, mas
expresso, deixei nas teclas a pessoa que mais próxima me é e assim tem sido
nestes últimos 43 anos das nossas vidas. Como defini-la? O que dela dizer hoje
e aqui? FOI, E É, UMA COMPANHEIRONA. Na simplicidade e na curteza expressiva
pretendo dizer tudo. Amiga, amante, colega, confidente. Enfim … mulher.
Tivera eu engenho condizente, e
este tempo de vida solidária daria um volumoso livro, já que retenho inúmeros
detalhes desta longa vivência. Ficam elencados alguns passos que me merecem
destaque e que refiro por ordem mais ou menos cronológica, que não pelo grau de
importância que lhe dedico.
. A determinação e cabeça erguida com que enfrentou o vulgo,
em época em que se dizia à boca grande ou mais pequena que éramos amigados, amancebados,
amantes, enfim cognomes sempre depreciativos. Era em 1970.
. A simplicidade e carinho com que acolheu os meus dois
filhos que escolheram viver connosco, pondo como condição que os
educaria como se dela fossem filhos e como educaria filhos que viesse a ter.
Assim se fez. Ajudou a criá-los
com alegria e, estou certo, passou-lhes alegria a eles. Acompanhou-os até ao
último dia em que viveram
connosco e mantém lindo relacionamento, considerando os filhos deles como
“seus” netos.
. A responsabilidade com que aceitou tomar conta do meu tio
que fui encontrar quase morto, que levei para o hospital onde
esteve várias semanas e depois ficou a viver connosco. “Tratá-lo-ei, são como
são e doente como doente, como se
fora o teu pai que já não tens”. Assim fez e quanto trabalho ele lhe foi dando
nos 9 anos que esteve
connosco.
. A insistência com que pressionou para que iniciássemos a
construção da nossa casa, tendo a “ousadia” de pedir a seu pai a
cedência do terreno, em altura em que as relações estavam ainda arrefecidas..
. Sobretudo não posso deixar de me curvar perante a
dedicação que teve para comigo, em período de grande carência, altura em
que tivemos que desfazer-nos de alguns anéis e em que, para não nos desfazermos
dos dedos, trabalhou dia e
noite para juntar mais uns tostões que nos permitissem manter dignidade e até
sustento. E em períodos de doença
grave foi o meu arrimo, foi a dispensa de todos os cuidados, qual enfermeira
dedicada. Ainda agora, sendo
que a saúde é jóia arredia cá em casa.
. Tenho que referir uma atitude de abnegação, desprendimento
e grandeza de alma que teve, há poucos anos, para com os três
enteados/filhos. Eles não sabem porque ficou guardado para nós ambos. Saberão um
dia destes.
BEM HAJAS, GUIDA,
PORQUE ESTAMOS JUNTOS HÁ 43 ANOS.
Em Caldas de S. Jorge, aos 8 de Maio de 2013