Afonso Camões pediu e obteve uma audiência com Joana Marques Vidal antes de o "Correio da Manhã" noticiar as ligações do director do "Jornal de Notícias" a Sócrates numa alegada operação para controlar a imprensa intermediada por Proença de Carvalho. Sobre as quebras do segredo de justiça, a PGR perguntou a Camões se achava que estas tinham origem na investigação, tendo o director do JN optado pelo silêncio.
Em comunicado enviado às redacções, a Procuradoria-Geral da República (PGR) esclarece que Afonso Camões, director do Jornal de Notícias, solicitou uma audiência em 8 de Janeiro e que esta se realizou no dia 15 - antes de o Correio da Manhã ter noticiado no sábado, 17 de Janeiro, as suas ligações a José Sócrates numa alegada operação para controlar a imprensa – e que fundamentou o pedido "no conhecimento de determinados factos relativos à denominada Operação Marquês, os quais gostaria que a Procuradora-Geral avaliasse".
Contudo, segundo acrescenta o comunicado da PGR, o director do JN usou esse encontro para manifestar "receios quanto à possibilidade, que considerava iminente, de serem publicadas notícias relativas às suas ligações pessoais com José Sócrates, tendo por base escutas realizadas no âmbito da Operação Marquês". Camões disse ainda "temer que as referidas notícias prejudicassem não só o seu nome, mas também o do Jornal de Notícias" e "pediu à Procuradora-Geral que o aconselhasse sobre o que fazer".
Sobre essa matéria, a Procuradora-Geral respondeu "não lhe poder dar conselhos nem pessoais nem jurídicos, os quais deveria solicitar a um advogado" e esclareceu "desconhecer totalmente se o nome do director do JN constava das escutas telefónicas efectuadas no referido processo". Joana Marques Vidal disse ainda "que sempre que há indícios de crime de violação de segredo de justiça é instaurado inquérito" e que "relativamente ao inquérito em causa já existem investigações em curso por violação do segredo de justiça".
O comunicado precisa igualmente que a Procuradora-Geral da República e o director do DCIAP Amadeu Guerra perguntaram ao director do JN se essas suas suspeitas, decorrentes de uma eventual violação do segredo de justiça, tinham origem na investigação, "tendo o director do JN optado por nada dizer sobre essa matéria".
O comunicado da PGR surge depois de Afonso Camões ter escrito hoje um texto de opinião no jornal que dirige, intitulado "Estado não cumpre e assobia para o lado", no qual revela o encontro com a PGR. Nesse texto, Camões alega que foi queixar-se de violação do segredo de justiça e que a PGR lhe respondeu "candidamente" para procurar um advogado. "O Estado português deixa que se violem sistematicamente o segredo de justiça e o direito de reserva da vida privada, e assobia para o lado. Posso testemunhá-lo. Disse isso mesmo à Senhora Procuradora-Geral da República, de quem se espera que seja a guardiã dos direitos de cidadania", escreve.
Segundo o "Correio da Manhã" de sábado, o ex-primeiro-ministro José Sócrates – detido preventivamente por indícios de corrupção, branqueamento de capitais e fraude fiscal qualificada – foi escutado a falar com um dos seus advogados, Daniel Proença de Carvalho (também advogado de Ricardo Salgado), sobre o negócio de compra da Controlinveste – o grupo que detém o "Diário de Notícias", o "Jornal de Notícias" e a TSF, e que é agora presidido pelo próprio Proença de Carvalho. Ainda de acordo com o "Correio da Manhã" (publicação da Cofina, proprietária do "Jornal de Negócios") terá sido o ex-governante quem escolheu o actual director do JN, Afonso Camões, e Proença de Carvalho chegou a reunir com o presidente da Entidade Reguladora para a Comunicação Social, Carlos Magno, para tentar travar as primeiras notícias sobre as suspeitas da casa de Paris, ainda em 2013, que foram avançadas pelo CM.
Na sua edição de sábado passado, o "Correio da Manhã" escreve ainda que, ainda em Maio, Afonso Camões terá avisado o ex-primeiro-ministro de que estava a ser investigado. No artigo hoje publicado, Afonso Camões não nega esta informação, afirmando apenas que em Maio não era director do Jornal de Notícias, mas presidente da administração da Lusa e por isso não actuava como jornalista, mas nega ter avisado José Sócrates como director do JN, dias antes da sua detenção, em Novembro. "Não podemos permitir que, a coberto de um caso mediático, empresas nossas concorrentes utilizem a mentira para tentarem ganhar vantagem", escreve Camões, numa referência implícita ao CM.
O texto de Camões surge depois de na sexta-feira, 16 de Janeiro, o CM ter denunciado em editorial um ataque "à liberdade de imprensa" e informado que vai constituir-se assistente no processo que envolve Sócrates e as alegadas tentativas do ex-primeiro-ministro de silenciar o jornal