segunda-feira, 29 de outubro de 2012


ECONOMIA TOUPEIRA

Seguimento ou, se quisermos, consequência imediata do trecho “A Economia Escondida” há dias saída, alguém me inquiriu se saberia algo de como era feita a contabilização das receitas e gastos da Viagem Medieval e qual a sua relação com a Administração Fiscal. Claro que não fazia a mínima ideia e, mesmo agora depois de algumas perguntas e pesquisas, alimento dúvidas e, quando nos estão a entrar fiscalmente nos bolsos, intrigo-me. Na NET pouco obtive. Possivelmente defeito meu. Fui pedindo aqui e acolá que me dessem dados básicos a partir de fontes com alguma credibilidade, sempre que possível documentais.
Primeiro saber a quem verdadeiramente cabe a organização do evento. Fonte, as páginas oficiais na Net. Se no “Regulamento de Participação para Exploração de Espaços –Área Alimentar – Tabernas” se lê que o evento é promoção da Câmara e da Federação das Colectividades e tem como executantes a Federação e a Feira Viva, noutro ponto diz-se que “é um evento de recriação histórica que resulta da iniciativa conjunta de organização da Empresa Municipal Feira Viva, da Câmara Municipal e da Federação (encurto a designação) que assumem como palco o centro histórico da cidade de S.M. Feira”. Noutro local lê-se que “é um projecto da responsabilidade e organização da Feira Viva EM, tendo como promotor o município de S. M. da Feira…..”
            Apesar destas ligeiras discrepâncias, sabe-se que o desenvolvimento tem a envolvência das três entidades, sendo seguro que o palco de implantação é o espaço público, gerido naturalmente pela Câmara que age como dona, que de facto é. A gestão burocrático/administrativa parece estar distribuída pela Feira Viva e Federação que tratam das diversas facturações e das relações com a administração fiscal.
Relativamente aos figurantes nos diversos espectáculos (muitos deles estudantes), estes emitem um “Recibo/Declaração de Acto Isolado” (cumprindo a lei), debitando IVA a 23% sobre o preço contratado, cabendo-lhe a obrigação de ir entregar o importe do IVA à Fazenda. O preço recebido terá, depois, que ser declarado em sede de IRS. Se o figurante for empresário em nome individual, ou colectivo, o procedimento será diferente, mas de resultado idêntico. O recibo é passado à Feira Viva, que é, de certeza, a entidade contratante.
Os ingressos são também da responsabilidade da Feira Viva que, seguramente, processa correctamente as confirmações de venda, emite o respectivo documento e liquida IVA à taxa de 13%, a taxa normal para espectáculos de âmbito cultural. Sabe-se que a quando das alterações das taxas de IVA em 2011, a cultura passou de 6% para 13% - os livros mantiveram os 6% - o tutela é escritor – e passaram para 23% os bilhetes para futebol e os espectáculos de pornografia (bem comparado!). A Feira Viva, ninguém duvidará, liquida e entrega ao Estado, IVA sobre todos os ingressos efectivamente vendidos.
A seguir referimo-nos à Área Alimentar e intui-se que não haverá dualidade de critérios relativamente à área de artesãos, mercadores, etc. Dissemos acima que o dono do palco da Viagem é a Câmara (todo o centro histórico, mais as margens do Caster, as guimbras, etc.) e não se viu nas diversas páginas na Net que a Câmara tenha cedido a propriedade dos espaços, nem das “barracas” e tendas, mesas e bancos, na área alimentar, como nas outras, nem à Federação, nem a outrem. Razão por que nos admirámos ao saber que é a Federação quem contratualiza e quem cobra o preço da ocupação dos espaços e dos equipamentos incluídos no contrato, na área alimentar às 23 associações, como a restaurantes e tabernas cedidas a privados, individuais ou sociedades. Por concomitância, será idêntico o procedimento nas outras áreas do mercado.
Um adviser mostrou-me uma factura passada pela Federação a um particular que, ao que parece, vendia só uma ou duas espécies de bebidas, por imposição de contrato. Logo chama a atenção o facto de a factura ter histórico correcto, o preço debitado certo também e não ter liquidação de IVA, nem indicação de que o imposto está incluído no preço. A primeira reacção é a de que houve ali uma evasão fiscal. No que respeita às Associações, é dito que nem factura é passada, mas só uma declaração/recibo a dizer que foi recebida a importância de xis pela cedência de espaço e “barraca”. Logo, sem liquidação de IVA. Para os de fora da área alimentar, haverá procedimento similar. Como são todos privados, haverá emissão de factura, sem IVA.
Poderá sempre haver a invocação de que as Associações (excluam-se os privados, portanto) ficam abrangidas pelo que dispõe o art. 9º. Nºs. 19 e 20 do CIVA. Não colhe, segundo algumas interpretações, porque a lei diz que poderá haver isenção “DESDE QUE NÃO PROVOQUE DISTORÇÕES DE CONCORRÊNCIA”. Está na cara que provoca e será caso para perguntar se os cafés, restaurantes e outros estabelecimentos localizados fora do perímetro do “palco” se não sentem afectados. E estarão esses também isentos de IVA, pelo menos durante a duração da Viagem? De resto é curiosa uma nota publicitária tirada das páginas na NET. Em título diz: “Onde comer em Santa Maria da Feira”. E segue o texto: “No recinto da feira medieval há petiscos deliciosos em diversas tabernas espalhadas um pouco por toda a parte. Dos salgados aos doces (…. ) não deixe de provar o suculento porco no espeto e um dos muitos e deliciosos doces ….” Que provoca distorção da concorrência, a ninguém deixará dúvidas. Tudo leva a crer que a passagem da facturação para a Associação das Associações foi exactamente para fugir à tributação, assim ao jeito das fundações por aí disseminadas que, o mais delas, só tem servido para esconder rendimentos e fazer evasão. Claro que depois haverá de considerar o facto de, na área alimentar, nenhuma taberna emitir documento fiscal de venda, donde, dos milhões de euros cobrados, nem um cêntimo vai para o “inimigo público”, quando se sabe que, no comércio normal da restauração, milhares de estabelecimentos fecham por não poderem pagar o IVA depois que passou para a taxa de 23%. Significa que a única liquidação de IVA sem fuga partirá dos fornecedores impostos pela organização (cerveja, sumos, carvão e gás) e será integral porque tem a ver com a comissão dada à organização. Os fornecedores não impostos debitarão sempre alguma coisa, mas será legítimo imaginar-se que padarias, talhos, etc. facturam só parte das vendas. O mínimo possível. O movimento é todo em numerário e não há talões fiscais!
Há quem alvitre que se invoca a prerrogativa de se considerar FEIRA FRANCA, para não haver impostos. Como? A feira franca não tem impostos, nem PORTAGENS. As portagens cobram-se e com IVA e, por outro lado, os fornecedores do exterior liquidam IVA. Deveria ser tudo isenção?

José Pinto da Silva

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