Fui, claro, à Feira Medieval. Fui duas vezes e expressamente para ver os
cortejos. De abertura e de encerramento. Talvez defeito meu, mas é o que mais
me fixa. Sem prejuízo de andar pelas zonas planas a ver o que vai sendo
apresentado em animações de rua (gaiteiros, percussionistas, fantoches, pedintes,
dementes, escravos etc.) e que não diverge grande coisa de um ano para o outro.
E passando, como não poderia deixar de ser, pela multidão de tendas de venda de
quase tudo, com relevância para o que se designa “zona alimentar”. Que, no
aspecto geral, também é mais ou menos igual de ano para ano.
E p’ra que raio haveria a minha atenção de ser chamada? Junto da
generalidade das tendas de comes e bebes não se viam aqueles bancos tão medievos,
de palha enfardada feitos. Viam-se alguns junto de barracas de quinquilharias e
artesãos a fazerem de expositores. E viam-se alguns na zona “urbana” e os que
estavam, estavam ensacados em tecido de ráfia. Devem ter ficado a perder os
animais “palhíveros” cujos donos e tratadores eram quem arrecadava os “bancos”
em fim de festa.
Do que ia passando por lá, pesquisava na imprensa, na grande e na local.
E o que muito era realçado era, em quase todas as inserções informativas, os
recordes de entradas e de ingressos vendidos e número de visitantes que estavam
sempre a ser batidos. Quais olimpíadas. Foi concluído que terão visitado a
Feira mais de 600.000 pessoas, o que coroa bem a 20ª.edição.
“A iniciativa é um projecto consolidado, que faz parte dos roteiros
nacionais e representa um desenvolvimento económico notável. Para além do
pequeno comércio, com particular incidência na restauração, a Viagem movimenta
sectores como o calçado, vestuário, peças de artesanato e até produção de
espectáculos. Já extravasa o concelho. Temos terras vizinhas que já trabalham
para a Viagem” O entre aspado foi retirado de declarações do autarca e
reproduzidas na imprensa.
Vou reter-me um pouco neste efeito multiplicador nas actividades
económicas. Só que, a movimentação comercial da Viagem desenvolve uma força
centrípeta e, se aumenta fortemente a actividade comercial no local do evento,
na sede do concelho, arrefece fortemente a actividade nas povoações limítrofes,
do mesmo concelho. Nomeada e principalmente no ramo alimentar. Tendo-se
consumido por ali centenas de milhar de sandes, de caldos e papas, de doces de
toda a espécie e milhares de litros de todas as bebidas, deixaram de se
consumir alhures. Claro que houve comerciantes e entidades de fora da sede, mas
concelhias, que ali estiveram e levaram algum pecúlio, partindo-se de que todos
fazem mais valia com as actividades.
A comunicação disse, no último dia da Feira, que visitaram o evento
600.000 pessoas. Não imagino o critério de cálculo, não existindo torniquetes
contadores, mas… como contrariar a informação? A contagem não terá sido a
partir de ingressos dispensados, mas, saiba-se lá, por olhadura aérea.
Fica no ar a questão: Tendo acontecido tamanho aumento de actividade
económica, e mesmo sem números de aumento que comparem com anos anteriores,
proporciona sempre um volume de transacções de forte monta, será que o “pobre”
Estado, via A. T. A., também viu as suas receitas aumentarem através da cobrança
de impostos, no IVA no imediato e depois em IR(c ou s)? Terá havido liquidação
de IVA logo nos ingressos? (a informação que chegou é que o preço das entradas
tem IVA incluído – sem ser dito, por se não saber, se incide sobre TODAS as
entradas vendidas). As empresas e individuais que fazem animação no evento, ao
que se sabe, para cobrarem o contratado, têm que emitir factura ou documento de
Acto Isolado e, nesses casos, há liquidação de IVA. Foi-me exibido um papel de
um individual que prestou colaboração e que auferiu um preço. Estas duas
actividades (ingressos e animação) são da responsabilidade da Feira Viva, logo,
para haver saída de pago terá que haver entrada de factura e recibo.
E no resto das actividades, a começar pela cedência dos espaços e das
“tendas”? Às Associações (são sempre 23 – sempre as mesmas de sempre, ou com
esporádica variação) são arrendados espaços (chão) e as “barracas” ou parte
delas, bem como as mesas e bancos, diz-se que por preços bastante caros e as
respectivas facturas não liquidam IVA – é esquisito porque aquele tipo de
contrato costuma ser sujeito ao imposto. Mas, se com alguma isenção, não
haveria de ter no documento a declaração de “isento de IVA conf. art. tal e tal
do CIVA”? E a todos os outros tendeiros, ou mercadores (para cheirar mais a
medievo)? Também não é liquidado IVA nas respectivas facturas! Será porque, de
propósito para isso, quem emite tais facturas é uma entidade que não é dona de
coisa nenhuma e “vende”, portanto, o que não tem e que se estriba no nome de
Federação de Colectividades? Porquê não é a Feira Viva a facturar esta
prestação de serviço? Até por ser dona dos espaços e dos equipamentos. Ficará
para quem de direito pensar, depois, nas relações tendeiros / mercadores com o Público visitante. Lembramo-nos todos que os ambulantes de praia foram
“apanhados” a vender Bolas de Berlim sem passar a respectiva factura. Há que trazer a maquineta a tiracolo e tirar o
papelinho com nif e tudo. E os outros…?
Uma Agência da OCDE (ou terá sido
da UE?) declarou um dia destes que Portugal deixou sem cobrar dois mil milhões de euros SÓ em
IVA. Vai-se buscar a receita aos mesmos de sempre para compensar!
Já agora e saindo para o exterior da raia feirense, salta a dúvida: Tem
havido todos os anos, e em 2016 bateram-se todos os recordes, montanhas de
festivais de música que congregam muitas centenas de milhares de pessoas idas
de todos os cantos do país. E mesmo de fora. Sabe-se que as organizações desses
espectáculos cobram pelos ingressos, e parece que cobram caro e a dúvida é se é
seguro e controlado o acesso de pessoas. E o número de pessoas corresponde ao
número de bilhetes vendidos? E em todos os bilhetes vendidos é liquidado o
respectivo IVA? Veio na comunicação que em Viseu entraram 1.000.000 de visitas.
Foi liquidado IVA sobre todos os ingressos vendidos? E sobre os “stands” dos
comerciantes? As promoções vangloriam-se de que atraíram tantas centenas de
milhar e a A T pode vangloriar-se de ver entrar o IVA correspondente? Veio a
lume que o PCP não liquida IVA nos ingressos nos recintos da Festa do Avante.
Nesse caso concreto haverá, talvez, suporte legal para essa isenção. Não
imagino como funciona o fornecimento de alimentação, recordações e
quinquilharias ao público visitante. Serão todos funcionários do partido, ou os
“mercadores” arrendam o espaço e exploram o comércio no período? Os tais
2.000.000.000 andam por aí espalhados”
José Pinto da Silva
10/09/016