segunda-feira, 8 de junho de 2015

SE EU FOSSE PARLAMENTAR (Faria uma intervenção assim. Se me deixassem)

Senhora Presidente do Parlamento,
Senhores Deputados,

Vou exteriorizar o meu sentir individual, com prévio conhecimento à minha bancada, que poderá repudiar alguns troços do que vou dizer, como acolher outros. Ou até repudiar para fora, apoiando para dentro. 
Sinto, desde há muito, sentimento solidificado com o que tenho ouvido e lido com origem no chefe do governo, sinto, dizia eu, que não convive lá muito bem com o tratamento de primeiro-ministro. É assim que, para o tornar mais confortável:

Excelentíssimo Senhor Presidente do Conselho de Ministros,

Pela forma de actuar enquanto governante, e mesmo como pessoa, pelas políticas que foi pondo em prática e pelas coisas de índole pessoal que mandou escrever em livro (chamei-lhe hagiografia), ressuda de todas as porosidades a nostalgia de querer, e não poder ainda, impor, sem direito a contestação, por falta da carda das botifarras, a miséria aos que são mais pobres, a pobreza aos que eram remediados, o remedeio aos que eram medianos na classe e crescer o luxo aos que já constituíam a fauna nababa, mesmo à custa do sangue dos mais pobres.
Vossa Excelência, Senhor Presidente do Conselho, talqualmente o seu antecessor no lugar e título, promoveu a fome generalizada e a consequente fuga massiva da nossa juventude para os diversos destinos de emigração. O antecessor de Vossa Excelência, em designação, foi mais decente, porque, ao menos, simulava impedimento de saída aos que enxotava, enquanto Vossa Excelência, com um desplante estarrecedor e ofensivo, manda os melhores, os mais qualificados, largarem o que chamou de zona de conforto, entendida como malandrice, ociosidade, quequice. Este insulto, além de o ser, é criminoso porque expulsa do país investimentos vultosos em saberes e ciência que vão render para quem só vai usufruir. Os países com gente pensante a governar. O antecessor de Vossa Excelência, em título, simulava não querer a saída de artesãos, trabalhadores braçais, ensinados só pelo ir fazendo ao longo dos anos. E, se expulsar gente qualificada que depaupera a qualificação da pátria, é um acto criminoso, como classificar quem o provoca?
O antecessor de Vossa Excelência em, epíteto, desenvolveu o lema de que ao povo bastava aprender a ler, escrever e contar e graduando as mulheres mais abaixo nessa bastança. Vossa Excelência, bem o querendo, não vai a tempo de fazer regredir tanto. Tudo fez para que, logo no básico (o mais antigo dizia “na primária”) crescesse exponencialmente o abandono escolar, aumento que cresceu no secundário e muito mais no superior, aqui também porque as famílias, confiscadas nos seus rendimentos, deixaram de poder pagar as propinas.
Aquele que, com o mesmo título, o antecedeu herdou uma dívida pública ingente e, é dito que o país estava à beira da banca rota. Ele, o tal antecessor de Vossa Excelência, perante todos os seus pares, perante o presidente da República de então, que não era grande coisa, mas era e exercia o cargo, e perante os militares que tinham derrubado o poder anterior, assumiu que iria causticar tudo e todos, que exigiria sacrifícios quase sem limite. Castigou forte, mas preveniu o país e o mundo. Vossa Excelência, para derrubar o poder em exercício contou com uma figura apagada e inútil que, estando em lugar de presidente da (sua) República, sua dele e de Vossa Excelência, assumiu que o governo haveria de cair. Fez de Judas, escondendo a mão na sombra dos arbustos, influenciou agências de rating, picou banqueiros e empresas de comunicação para as celebrizadas entrevistas diárias de uma jornalista a esses banqueiros, tudo anexado ao insultuoso discurso de 9 de Março de 2011. Atingiu o desiderato de ambos. Caiu o governo e Vossa Excelência atingiu o pote. Só que mentiu, mentiu, mentiu, saqueou salários, saqueou pensões e, fez crescer a dívida até limites quase sem limite.
Recordar-se-á, Senhor Presidente do Conselho de Ministros, se porventura não assentou (ainda) a nadegueira nalguma cadeira com defeito de fabrico, ou mesmo sabotada, lembrar-se-á de ter ouvido falar numa forma de matar a fome, fome da negra, daquela de se andar mais do que um dia sem fazer cair o que quer que seja na boca do estômago que o antecessor de V. Excelência inventou. Chamou-lhe a Sopa dos Pobres. Há fotos dos anos 30/40 e mesmo 50 com filas intermináveis de gente à espera de vez para receber a tigela. Pois Vossa Excelência, Senhor Presidente do Conselho, depois de saquear a quase totalidade dos apoios sociais aos mais pobres, aos mais velhos e às crianças deste país onde, desgraçadamente, também nasceu, depois de todo esse saqueio, depois de ter produzido tanta fome e tão inane como a dos 40/50, ao jeito de compensação, mas para temperar a fome com a humilhação pública dos famintos, criou muitos, muitos refeitórios ditos sociais. Vossa Excelência, Senhor Presidente do Conselho não pode deixar de ver as enormíssimas filas de gente, proporcionalmente bem mais faminta do que a dos 40/50. Agora um tanto diferentes as imagens. Aparecem nos jornais e nas redes, a cores. São pobres com muita fome, mas mais coloridos.
O que antecedeu Vossa Excelência, desde os 30 aos quase 70 do século XX, terá distribuído fome a esmo, talvez por falta de alternativa e também porque era ideológico. A fome amansa e abre caminho fácil a outros ataques contra os direitos fundamentais. Vossa Excelência, Senhor Presidente do Conselho de Ministros, age só por impulso ideológico, porque no mundo, no imundo entender de Vossa Excelência, só há lugar para Vossa Excelência, mais aquele grupo de apaniguados e lacaios que o cercam e bajulam. São parecidos enquanto detentores do poder e no exercício do mesmo. São ambos parecidos no desejo de amordaçar, custe o que custar. Mas fica uma diferença insanável. O antecessor de Vossa Excelência, o dos anos 40 e durante mais de 40, era mau, era ditador, mas era inteligente.

José Pinto da Silva.  



Comentários
0 Comentários