Senhora Presidente do Parlamento,
Senhores Deputados,
Vou
exteriorizar o meu sentir individual, com prévio conhecimento à minha bancada,
que poderá repudiar alguns troços do que vou dizer, como acolher outros. Ou
até repudiar para fora, apoiando para dentro.
Sinto, desde
há muito, sentimento solidificado com o que tenho ouvido e lido com origem no
chefe do governo, sinto, dizia eu, que não convive lá muito bem com o
tratamento de primeiro-ministro. É assim que, para o tornar mais confortável:
Excelentíssimo Senhor Presidente
do Conselho de Ministros,
Pela forma de
actuar enquanto governante, e mesmo como pessoa, pelas políticas que foi pondo
em prática e pelas coisas de índole pessoal que mandou escrever em livro
(chamei-lhe hagiografia), ressuda de todas as porosidades a nostalgia de querer,
e não poder ainda, impor, sem direito a contestação, por falta da carda das
botifarras, a miséria aos que são mais pobres, a pobreza aos que eram
remediados, o remedeio aos que eram medianos na classe e crescer o luxo aos que
já constituíam a fauna nababa, mesmo à custa do sangue dos mais pobres.
Vossa
Excelência, Senhor Presidente do Conselho, talqualmente o seu antecessor no
lugar e título, promoveu a fome generalizada e a consequente fuga massiva da
nossa juventude para os diversos destinos de emigração. O antecessor de Vossa
Excelência, em designação, foi mais decente, porque, ao menos, simulava
impedimento de saída aos que enxotava, enquanto Vossa Excelência, com um
desplante estarrecedor e ofensivo, manda os melhores, os mais qualificados,
largarem o que chamou de zona de conforto, entendida como malandrice,
ociosidade, quequice. Este insulto, além de o ser, é criminoso porque expulsa
do país investimentos vultosos em saberes e ciência que vão render para quem só
vai usufruir. Os países com gente pensante a governar. O antecessor de Vossa
Excelência, em título, simulava não querer a saída de artesãos, trabalhadores
braçais, ensinados só pelo ir fazendo ao longo dos anos. E, se expulsar gente
qualificada que depaupera a qualificação da pátria, é um acto criminoso, como
classificar quem o provoca?
O antecessor
de Vossa Excelência em, epíteto, desenvolveu o lema de que ao povo bastava
aprender a ler, escrever e contar e graduando as mulheres mais abaixo nessa
bastança. Vossa Excelência, bem o querendo, não vai a tempo de fazer regredir
tanto. Tudo fez para que, logo no básico (o mais antigo dizia “na primária”)
crescesse exponencialmente o abandono escolar, aumento que cresceu no
secundário e muito mais no superior, aqui também porque as famílias,
confiscadas nos seus rendimentos, deixaram de poder pagar as propinas.
Aquele que,
com o mesmo título, o antecedeu herdou uma dívida pública ingente e, é dito que
o país estava à beira da banca rota. Ele, o tal antecessor de Vossa Excelência,
perante todos os seus pares, perante o presidente da República de então, que
não era grande coisa, mas era e exercia o cargo, e perante os militares que
tinham derrubado o poder anterior, assumiu que iria causticar tudo e todos, que
exigiria sacrifícios quase sem limite. Castigou forte, mas preveniu o país e o
mundo. Vossa Excelência, para derrubar o poder em exercício contou com uma
figura apagada e inútil que, estando em lugar de presidente da (sua) República,
sua dele e de Vossa Excelência, assumiu que o governo haveria de cair. Fez de
Judas, escondendo a mão na sombra dos arbustos, influenciou agências de rating,
picou banqueiros e empresas de comunicação para as celebrizadas entrevistas
diárias de uma jornalista a esses banqueiros, tudo anexado ao insultuoso
discurso de 9 de Março de 2011. Atingiu o desiderato de ambos. Caiu o governo e
Vossa Excelência atingiu o pote. Só que mentiu, mentiu, mentiu, saqueou
salários, saqueou pensões e, fez crescer a dívida até limites quase sem limite.
Recordar-se-á,
Senhor Presidente do Conselho de Ministros, se porventura não assentou (ainda)
a nadegueira nalguma cadeira com defeito de fabrico, ou mesmo sabotada,
lembrar-se-á de ter ouvido falar numa forma de matar a fome, fome da negra,
daquela de se andar mais do que um dia sem fazer cair o que quer que seja na
boca do estômago que o antecessor de V. Excelência inventou. Chamou-lhe a Sopa
dos Pobres. Há fotos dos anos 30/40 e mesmo 50 com filas intermináveis de gente
à espera de vez para receber a tigela. Pois Vossa Excelência, Senhor Presidente
do Conselho, depois de saquear a quase totalidade dos apoios sociais aos mais
pobres, aos mais velhos e às crianças deste país onde, desgraçadamente, também
nasceu, depois de todo esse saqueio, depois de ter produzido tanta fome e tão
inane como a dos 40/50, ao jeito de compensação, mas para temperar a fome com a
humilhação pública dos famintos, criou muitos, muitos refeitórios ditos
sociais. Vossa Excelência, Senhor Presidente do Conselho não pode deixar de ver
as enormíssimas filas de gente, proporcionalmente bem mais faminta do que a dos
40/50. Agora um tanto diferentes as imagens. Aparecem nos jornais e nas redes,
a cores. São pobres com muita fome, mas mais coloridos.
O que antecedeu
Vossa Excelência, desde os 30 aos quase 70 do século XX, terá distribuído fome
a esmo, talvez por falta de alternativa e também porque era ideológico. A fome
amansa e abre caminho fácil a outros ataques contra os direitos fundamentais.
Vossa Excelência, Senhor Presidente do Conselho de Ministros, age só por
impulso ideológico, porque no mundo, no imundo entender de Vossa Excelência, só
há lugar para Vossa Excelência, mais aquele grupo de apaniguados e lacaios que
o cercam e bajulam. São parecidos enquanto detentores do poder e no exercício
do mesmo. São ambos parecidos no desejo de amordaçar, custe o que custar. Mas
fica uma diferença insanável. O antecessor de Vossa Excelência, o dos anos 40 e
durante mais de 40, era mau, era ditador, mas era inteligente.
José Pinto da Silva.